O esporte como fonte de educação

Projeto Grael transforma histórias de crianças e jovens através da vela
Alunos do Projeto Grael, em Niterói, preparas as velas cuidadosamente para começarem as aulas na Baía de Guanabara
Marcelo Amorim (26), em 1998, fez parte de uma das primeiras turmas do projeto social que mudou a vida dele. Depois de algumas idas e vindas, Marcelo voltou em 2006 e está no projeto até hoje. Só que agora não mais como aluno e sim como instrutor de vela. Assim como Marcelo, mais de oito mil crianças e jovens de escolas públicas de Niterói, entre 9 e 24 anos, já passaram pelo Projeto Grael, que pertence ao Instituto Rumo Náutico.

- O projeto deu 360º na minha vida, me deu oportunidade de fazer vários cursos e ter uma carreira – contou Amorim, que faz faculdade de Educação Física e que através do projeto fez curso de juiz e gerenciamento de regatas.

Há 12 anos, em um contêiner na praia de Charitas, foram criadas as primeiras turmas, através de uma iniciativa dos irmãos velejadores Torben e Lars Grael e o velejador Marcelo Ferreira. Em 2004, o projeto passou a ocupar o espaço do antigo hotel Samanguaiá em Jurujuba, onde, atualmente, é a sede. O irmão mais velho Axel Grael, ex-presidente da Feema, é o atual presidente da instituição.

A animação e a vontade de aprender das crianças e jovens são notórias logo quando se chega ao pátio, onde os alunos lavam cuidadosamente as velas que acabaram de usar para retirar o sal.

Os alunos têm como sala de aula a Baía de Guanabara, onde aprendem a velejar. Assim que entram no projeto, fazem natação, que é essencial para a segurança durante a navegação. Até os 15 anos cursam Optimist, que é uma classe onde são usados barcos menores que recebem nomes de brincadeiras infantis, como estátua e detetive. Depois, cursam a classe Dingue, na qual os barcos recebem nomes de ventos, como tornado e brisa.

Há uma classificação dentro do projeto para os alunos que se destacam na vela que passam a fazer parte do time estrelas do mar, já são cerca de 50 alunos que participam de competições amistosas, oficiais, estaduais e nacionais.

A competição brasileira Desafio Solar também tem a participação dos alunos do Projeto Grael nas etapas classificatórias para uma maior que acontece na Holanda. Na competição são usados barcos movidos a energia solar. A embarcação do Projeto Grael que é usada no Desafio Solar, Peixe Galo, foi construída pelos próprios alunos em 2009.

Mas não é somente a vontade de ser um velejador que atraí meninos e meninas a fazerem parte do projeto. A preocupação com o futuro profissional faz com que muitos jovens possam aproveitar a oportunidade para se especializarem em marcenaria, capotaria, mecânica, eletroeletrônica, refrigeração e fibra de vidro. A assessora de imprensa do projeto, Mariane Thamsten, explicou que os cursos profissionalizantes preparam os alunos para o mercado náutico e também para se tornarem administradores dos barcos.

A vontade de aprender e a preocupação com o futuro atraíram Bruno Nunes (18) para as aulas de cursos profissionalizantes. Bruno entrou no projeto em 2005 e hoje não faz mais aula de vela e nem cursos, mas continua no projeto como voluntário.

- Eu quis me profissionalizar através dos cursos do projeto para que eu mesmo fizesse os reparos nos barcos. E, também, se a vela rasgasse, eu pudesse saber como costurar – contou Bruno, que fez curso de marcenaria, capotaria e fibra de vidro.

É só passar um dia na sede em Jurujuba e conversar com os diversos jovens e crianças que movimentam o instituto para perceber que as histórias dos alunos se repetem. Alguns deles mesmo quando terminam as aulas de vela e os cursos profissionalizantes continuam integrantes do projeto. É o caso de Laís Carvalho (18), que foi aluna entre 2007 e 2009 e hoje permanece no projeto todos os dias, mas agora como secretária.

- Foi aqui que eu aprendi quase tudo que eu sei hoje em dia – disse Lais, que sonha em criar seu próprio negócio, uma loja de capotaria, para colocar em prática tudo que aprendeu durante o curso.

Além da iniciativa esportiva e profissionalizante, o projeto oferece programas ambientais, que visam à conscientização da importância do meio ambiente. Um deles é o projeto piloto Águas Limpas, que existe há três meses. Com uma embarcação francesa e durante seis dias da semana, os alunos recolhem o lixo flutuante das praias de Niterói que estão dentro da Baía. Para o biólogo e coordenador do projeto, Vinicius Pinheiro, o fator principal é a chuva.

- Quando chegar as chuvas de verão, com certeza, ele estará bem ativo – garante Pinheiro.

Outro programa ambiental é o projeto Baía de Guanabara, na qual são jogados cinco derivadores –bóias- na água que são monitorados por GPS. Através dessa iniciativa, está sendo feito um mapeamento sobre a direção das correntes, que, além de ajudar os alunos a entenderem mais sobre o meio ambiente, facilita saber o provável percurso do lixo flutuante, o que favorece o projeto Águas Limpas.

- O projeto permitirá aos competidores de vela nas Olimpíadas de 2016 saberem a direção dos ventos, o que fará do Brasil um dos poucos países que fornece esses dados a atletas – certificou Valéria Braga, coordenadora de programas ambientais e profissionalizantes do projeto.

Durante a Semana do Meio Ambiente, em agosto deste ano, o projeto realizou a I Gincana Ecológica, cerca de cem alunos recolheram 400 kg de lixo na praia do Morcego, localizada na Baía de Guanabara, onde o acesso é possível apenas de barco, o que impede a Companhia de Limpeza de Niteroi (Clin) de limpar a região. Pinheiro destacou que a praia ficou limpa e que pretende manter essa iniciativa, pelo menos uma vez por ano.

A junção da educação ambiental, profissional, esportiva é o que torna o projeto referência no país. A primeira, e por enquanto a única, filial fica no município de Três Marias, em Minas Gerais. São cerca de 150 alunos que desfrutam de uma área duas vezes maior do que a Baía de Guanabara. Mas o desejo de ampliar o projeto não para, existem algumas propostas de criação de mais duas unidades descentralizadas, uma na capital baiana, Salvador, e a outra na cidade do litoral paulista, Guarujá, revelou Thamsten.

- O projeto mudou muita coisa na minha vida porque antes eu ficava na rua e também me fez cortar o cabelo – brincou Wallace Martins (14), que entrou no projeto no começo deste ano e já pretende ser um velejador.







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